sábado, janeiro 09, 2010

Ex-Cientista

Não quero mais estudar meu corpo. Não quero mais dissecar minha mente. Não quero mais entender as razões. "Quais razões?" Todas, ora. Das razões do meu sofrimento às razões do seu sofrimento. Das razões das vontades às razões das inércias. Fiz a opção pelo desconhecimento. Me formei em Ex-Cientista.

Agora a história começa comigo andando pela rua - sem destino definido e sem ter saído de algum lugar mas apenas andado, ou seja, me vejo andando na rua, como se tivesse acabado de nascer em pé e movendo minhas pernas. Vantagens da escrita: todo personagem nasce no presente. Ninguém tem história pregressa ou razões enquanto o autor não as definir e, como agora sou um Ex-Cientista graduado, não pretendo que eu, o personagem desta história,tenha passado, já que razões e nascimento sempre serão atos do passado... ou do futuro - dependendo do gosto. Falando em futuro, eu, o personagem, caminho mas não tenho onde chegar - e isso me faz lembrar que ainda não falei sobre o esquecimento que as vezes me acomete. Pronto, falei. Agora, vejam, caminho ainda. Por vielas. Por grandes retas. Por calçadas sujas - não me perguntem se já foram limpas, não quero saber. Caminho também por áreas residenciais. Passam por mim crianças amigas de um domingo de sol. Pipas e balões, muita gritaria. Saio da calçada e piso na grama. Da grama passo ao chão de terra duma grande praça que se transforma em mata fechada. Caminho por pedras. Estradas antigas. Sons de pássaro sobrepõem às buzinas. Caminho pela trilha paralela ao ribeirão escuro - não quero saber de que é feita a água do rio mas vejo carpas e tilápias. Ponho os pés na água e descubro que estou descalço.