segunda-feira, agosto 16, 2010

Nova Délhi 2

Estava de novo com aquela sensação. Era a hora de embarcar para uma nova viagem em busca de uma nova casa. Os ambientes, as formas, cores, falas, trocas e medos daqui lhe aconselhavam isso... há mais de ano.
Por outro lado..
Ele abriu o envelope que o esperava na mesinha da sala (há 3 dias). Entre contas a pagar e garranchos de telefones, compromissos e endereços, lá estava o envelope que ele mesmo havia lacrado. Leu a carta:
"Carlos, eu te amo. Eu te amo muito. Aguardo em fevereiro tua chegada. Venha em paz. Te receberei com um sorriso sincero, pleno. Por favor, venha assim também. Te peço que com um sorriso sincero, pleno. Eu te amo amo amo. Você vai poder ver isso, sentir... Nas crianças que vão correr em sua direção com sorrisos branco-cegantes. mas peço que tome cuidado com os velhos de grandes olhos esbugalhados. Junte aí suas forças. Economize suas energias. Organize seu espírito, meu doce. Pois guardará aí dentro seu amor. Eu te receberei com meus braços de ninfa. Beijos no coração do amor e na testa da certeza. Sua anfitriã amante quase-irmã, Nova Délhi."

São 4h. Lá fora a cidade está escura. O mantra da cidade reverbera em minha caixa craniana. Repito-o em voz alta para dar motivos para eu chorar. Choro e canto. O que começa com um sussurro vira meu grito particular. Acordo a vizinhança que reclama em altos brados. Quem me dera fosse assim... Apenas digo em voz alta para o teto seu nome mais bonito e ali permaneço com a alma em convulsão. Se de fato chorei não é certo que eu tenha gritado. Nova Délhi. Estremece meu corpo o som dessa cidade. Cumprirá sua promessa? Não hesito em dizer que sim. Sempre busquei soluções custosas para problemas simples. Agora chego a um novo momento. Problemas simples?

domingo, agosto 01, 2010

Nova Deli

Ele ainda não dorme à noite. Não sei o que acontece. Algo mudou quimicamente em seu cérebro. Seu corpo até pede descanso. Pede não, implora. É visível. As olheiras fundas, a cara derretida. Curioso como ele não relaxa. Diz que não pára de pensar. Pensar o que? Em quê? Ele diz que é em tudo. Como alguém pode pensar em tudo? Ele só confirma. Diz que pensa em tudo mesmo - e ao mesmo tempo. O coração anda sentindo as consequências disso. O médico disse que se ele não conseguir reverter esse quadro não sabe como vai ser. Eu também não sei. Ele está mais fugidio que o habitual. Tudo bem que ele nunca foi dos mais sociáveis do mundo, apesar de ser uma pessoa gentil, amável à vista de todos. Não há quem não o elogie nesse sentido. Bom rapaz, sensível. Confiável. Mas pensa demais. Reclama de dores pelo corpo. O braço esquerdo pulsando em dores constantes. De vez em quando surpreendo ele chorando no quarto mas assim que me vê tenta disfarçar. Segura o ombro. Está tudo bem? Então ele diz que sim querendo dizer que não, estou péssimo. Eu já o conheço. Pergunto se não vai sair pra ver os amigos. Diz que não e vai para o quarto. Liga o computador. Vai trabalhar. Acha que me engana. Passa horas ali, lendo e escrevendo. Outro dia fui conferir. Um texto bonito, bonito mesmo. Haviam outras telas abertas. Duas de sites de redes sociais. Frases. Comentários. Outra era do site da Air France. No bloco de anotações do lado do teclado havia uns garranchos. Cálculos. E acho que li o nome N. Deli. Não sei porque me veio um pensamento-resposta: "Tomara que ele consiga."