sexta-feira, novembro 26, 2004

Andando como nosferatus

Esperei por ele toda manhã. Ele veio.
Falou algo que era a mesma frase dita meses atrás. Nem ao menos a inflexão... Nem ao menos na voz uma mudança. Caminhamos porque era natural que decidíssemos caminhar já que tudo era déja vu. Ao tentar tomar sua mão senti uma reprimenda que me deixou um tanto confusa. Recolhi e senti... meus dedos estalaram; minha mão ficou fria.
Foi falando um pouco mais de coisas que sempre eram (sempre foram?) sentenças incompletas interrompidas pelo ar. Tomei o ar e não havia vento, nem prenúncio de nada tempestade, portanto, o problema estava aqui.
A cidade foi se abrindo sem escolha sem vontade. As ruas passeavam por nós como se nós é que fossemos um certo lugar. Eu reprimi um sentimento dominó porque era natural reprimí-lo. Engoli-o tipo uma pílula. Isso, desce devagar pra ser triturado pelas forças intestinas. Bateu um mal estar e resolvi olhá-lo logo. De uma vez. Por todas. De nada. Por nada. Não sei. Estava muito tranquilo mas ficou desconcertado, como de hábito.
Ah, resolvi te olhar pq, sabe-se lá... vai que te cai uma bigorna.

Vai que me entra uma bala perdida.

segunda-feira, novembro 22, 2004

O Ogro ataca

A exposição dos pintores românticos franceses teria sido um sucesso não fosse a aparição do Ogro.
O monstro veio e tudo foi destruído. Todas as obras trucidadas em plena inaguração. Não só as obras como 80 dos 90 convidados... Trucidados.
Du caralho o Ogro entrou, impressionante, arrebentando a clarabóia do museu, espalhando vidro pra todo lado. Muitas lascas de vidro rasgaram as roupas e as carnes das senhoras e senhores presentes. Também crianças não ficaram sem sua cota de dor.
O Ogro afundou os pés gigantes no chão amparando o próprio corpo disforme e desgraçando o piso feito de mosaicos restaurados do Brasil Colônia. Uma jóia de mais de um 1 milhão de reais pisoteada e transformada em farelo... a prova de restauro.
Um estrondo de canhão. Chutou a porta de vidro que separava a seção de pinturas do salão do convescote. O monstro se amarra em tudo tudo tudo que é de vidro. Ele curte quebrar tudo que pode se transformar em máquina cortante de dilacerar.
Um braço dele quando se levanta é pra valer e pra varrer. Varrer vidas. Então o braço do Ogro varreu os guardas dali e eles foram cuspidos pra fora do museu a uma velocidade estonteante. Mais vidraças quebradas. Inclusive de carros, pois os guardinhas foram jogados para cima de veículos em movimento, sendo que um era um coletivo.
Ogro odeia. Ogro esmaga.
Pastel folheado, isso é um quadro, uma pessoa, qualquer coisa na boca do monstro. Ele come obras. Mete os dentes. Os dentes guincham. Parecem máquinas. Máquinas de comer o que aparecer pela frente. Os dentes mastigam enquanto os braços se ocupam de arremessar os infelizes... no finado abrigo da arte mundial. Cadeiras vitorianas transformadas em lascas velhas no ar, sem o menor valor cultural.
Separam-se corpos de cabeças. É muito diferente do que se vê nos filmes. É menos agressivo pq parece mais fácil. A vida humana é frágil demais para a pirotecnia do cinema. Um corpo quando morre é dramático porque ele fica parado não pelo sofrimento em si. Como pode num instante o que é vivo e cheio ficar bruto e vazio?
Bom, um ogro tem em média 4 metros. Nosso amigo tem o dobro da altura e braços e pernas mais grossos que um homem gordo. Cada movimento desses membros, uma porrada nas nobres paredes do átrio central abalando seriamente as estruturas e fazendo com que colunas de mármore e lajes de concreto virem uma arapuca de esmagar gente.
James estava lá.
Filmou tudo com sua mini-dv. A uma distância minimamente segura, se é que pode existir isso num espaço de chacina. De amanhã em diante, suas cenas percorrerão o mundo e farão a fortuna de seu produtor. A neblina espessa de pó fará parte dessa produção caseira. Um efeito visual emocionante. E os lamentos dos sobreviventes, a trilha incidental.
45 minutos de pavor. Daí, o silêncio.
O Ogro não estava mais lá. Não tão espetacular foi sua saída e, no entanto, foi só baixar a poeira, pra ver o rastro pesado da criatura que seguiu destruindo também outras alas.
James desligou a câmera. Colocou-a dentro da bolsa e parou pra analisar o estrago.
Arte, vidas e arquitetura reviradas num caldo de sangue, pó e... vidro.
Vidro enfiado em carnes. Carnes reais e carnes pintadas. Crânios perfurados por quinas de molduras do século XVIII e colunas gregas falsificadas deitadas sobre duzias de mortos. Essas misturas estavam formando uma nova tela. Os elementos caóticos sempre formam um novo padrão. James ficou olhando. Meio hipnotizado. Excitado. O jovem estudante de medicina olhou. E então... Viu. Estacado de pé, congelado no tempo, apanhou vagarosamente sua câmera e...

Registrou aquela obra.

Espanque o miserável

Não se espante se um dia vc tentar sair de sua casa e não conseguir.
Vc vai tentar lembrar onde colocou a chave da porta mas não vai achá-la. No início pode ser q você sinta graça mas vai parar de rir rapidinho quando tentar chamar a pessoa que mora contigo (esposa, marido, namorada(o), filho(a), amigo(a)) e descobrir que não tem o telefone dela e nem sabe mais de cor. Neste segundo momento ainda achará apenas inusitado. Tragicômico. Dando de ombros vai pensar que foi até bom ter perdido a chave. Crerá na coisa do destino ou num impulso inconsciente, já que você tem trabalhado demais e merece, se não umas boas férias, ao menos, um dia de vadiagem. De qualquer forma, vai esperar a ligação do pessoal do escritório... mas isso também não vai acontecer. Que estranho, né?
Deitará mas não irá dormir.
Levanta então e vai fazer uma nova procura pela chave.
Já perdeu a manhã e agora perderá o resto do dia... será? sim!!!
É claro que vc não vai achar sua chave. Vai achar várias coisas que estavam perdidas há muito tempo. Ironicamente, achará até a chave anterior... aquela que vc tinha dado como perdida na rua e que te forçou a fazer uma nova fechadura (a chave atual que desapareceu). Miséria.
Vai para a sala porque cansou de andar para um lado e para o outro do apartamento.
Vai ligar a tv. Não vai ver nada... nada além das barras verticais coloridas e duma música de consultório.
Está será sua programação para os próximos dias e meses - em todos os canais.

O interfone - que já não funcionava direito antes - prossegue em inutilidade.
A janela tem trancas. Vc lembra disso? Pois tem. Elas têm trancas cujas chaves vc também perdeu - se é que algum dia vc as teve.
Não se espante também quando for ouvir o rádio. A única estação será a rádio relógio. "Ao menos", vc se conforta," saberei as horas..."

Saberá. Sim saberá cada hora, cada minuto, cada segundo em que estiver trancado em sua própria casa. Sozinho.

Já o terceiro dia será de puro desespero. Ninguém voltou pra casa. Ninguém te ligou e vc não consegue ligar para ninguém. O comp continua sem conexão com a internet. A TV ainda está com 24 h de color bar e música de consultório. A rádio relógio ainda é sua única comunicação com o mundo.

Vc se observará no espelho esperando que sua boca dê a resposta. Não.

A geladeira tem provisões para 3 meses, vc acha, mas tudo que vc tem é um pote de maionese helman's da pessoa que dividia esse espaço contigo. Também uma garrafa de coca-cola. O pão de forma mofou. E o pacote de água e sal já está pela metade.

Ouvir um dos seus cds seria bom mas vc descobre que seu aparelho está com defeito. O único cd que ele aceita é dum curso de inglês easy learning da pessoa que dividia esse espaço contigo. Para variar dos informes pontuais da rádio relógio vc vai se contentando com esse cd e acaba percebendo uma música ao fundo.

Não se espante também quando gritar como um alucinado dentro de sua casa e depois se descobrir de volta ao absurdo silêncio. As crianças do play não brincam, nem fazem mais barulho. Faz muitos meses que vc não ouve os murmúrios, brigas e discos horrorosos dos seus vizinhos. Vc está só no prédio.

Desesperado e esfomeado.

11 meses se passaram. Vc não tem mais forças para se exercitar e queimar as calorias acumuladas da maionese estragada e da coca choca que vc se obrigou a consumir. Até mesmo a pasta de dente já lhe serviu de comida. Admita sua morte.

A memória falha. Vc nem lembra mais como são seus parentes... seus amigos... vc tem amigos? vc já teve amigos? Ninguém deu por sua falta e vc sempre os tratou bem, não tratou? Acoca-cola agora é um traço escuro no fundo do copo. Seus dentes doem. Suas gengivas sangram. Um dia vc já teve dentista. Será natal? Será ano-novo? Será seu aniversário? Que diferença faz. Todos os dias são de silêncio. A lâmpada dos três cômodos queimaram e vc não tem uma de reserva. Vc ainda sabe trocar uma lâmpada? A esta pergunta vem uma imagem como há muito tempo não vinha. Um sonho desperto... Vc lembra de algo que viu em algum lugar e entende que foi da tv - o reino obtuso dos color bars. Era uma comédia pois vc ria. Há quanto tempo vc não ri. Rindo agora... Que engraçado... Vc está tendo uma ereção ou algo que lateja forte no baixo ventre.

Não se espante.

Após o desespero que te levou a revirar a casa toda e transformá-la numa selva, vc atravessa os dias dormindo. Em estado de profundo cansaço, melhor, profunda má vontade. Deixa sua mente se isolar para se lembrar dum tempo em que vc era limpo. A água do chuveiro continua firme porém não tão forte. A coloração é escura e ferruginosa mas... que opção vc tem?

Pois bem... Não se espante quando o sol bater no seu rosto estatelado no chão há dias demais para que sua cabeça consiga perceber quanto tempo se passou... e este mesmo sol te trouxer uma imagem bípede ereta a te esperar.

Não se espante, a imagem ainda estará em formação. Vc se levantará e ela lhe dará: PA-RA-BENS. Vc se descobrirá astro dum show. Saberá das câmeras em cada cômodo da sua casa. Verá sua imagem no video-tape vendo em replay teu sofrimento. O apresentador diz isso tudo sorrindo e lhe dá um cheque gigante. Mostra-lhe a porta onde estão seus amigos e parentes e diz que vc é um sucesso. Muito bem.

Vc sabe o que deve ser feito. É isso.

Espanque o miserável.

Em Busca do Ouro

Eu nasci pelo cu.
Já nasci fudido. Cagado e cuspido.
Mandei se fuder meu vizinho por causa da porra da obra que ele tá fazendo a 4 meses. Quatro meses!!! Sabe lá o que é isso? Furos no tímpano.

Pessoas nascem de parto normal. Pessoas nascem de cesariana. Eu não. Eu nasci cagado.

Manchete: "Quebrou a janela do quarto arremessando uma cadeira giratória." Não. Comprida demais.

Pistão. Comprei um pistão pra tocar de madrugada. Minha guerra pessoal.
Depois veio a picareta. Arrebentei o teto da casa daquele sujeito ordinário meu vizinho.
Proibem as pessoas de comprar armas. As armas somos nós. Dê-me um clips e te dou 50 motivos para proibir o livre comércio desta desgraça nas lojas.

Saio destruindo tudo. Quer saber? Vou cavar um buraco. Do rombo no chão da sala - teto da sala, na visão do vizinho - os operários da obra podem assistir meu espetáculo. É minha propriedade, destruo ela do jeito que eu quiser.

Por baixo das paredes existem canos. Nestes canos passam águas. Arrebente a parede com a picareta até achar os canos e fure-os. Veja o que acontece. Espirrarão muitas águas. Uma hemorragia.

O interfone não pára de tocar. Do grande vão do prédio vem os gritos.
A picareta é o maior intrumento na luta do homem por sua dignidade.
Minha intenção é explorar esta caverna até achar ouro ou petróleo...
Eu sou um desbravador... Um artesão de cus...
...E quem tiver na frente que se foda.


Debate no Congresso Bilíngue

Levantou o dedo pra pedir a vez pra falar.
Não sendo dada considerou-se obviamente ignorada.
Era só mais um congresso bilingüe (português-alemão). Não pensou duas vezes. Expôs sua discordância com um arremesso de salto alto. Fincou na cara do segurança. Infelizmente não atingiu a mesa. Algazarra é confusão, mas as pessoas ignoram as palavras antigas. Elas acabam caindo em desuso por pura preguiça e preconceito. Isso faz com que nse usem cada vez mais palavras usuais nos textos. A pobreza em nosso vocabulário vem de posturas como essa. Ou passamos a usar nossas palavras mais ricas e mal aproveitadas ou iremos todos comer capim.
Agarram-na pra retirar do recinto. Tudo voltou a paz de antes. Os conselheiros aproveitaram para rememorar aos ouvintes as regras para participar da palestra: todas as perguntas têm de ser escritas nos papéis entregues previamente pelas moças de creme. Quem não tivesse os papéis que ficasse calado ou que se contentasse em ser ignorado. Educação é disciplina. Disciplina e moderação. O mundo de hoje tá essa zona por que as pessoas não sabem se moderar.
Lá fora a puta gritava.
Na apresentação com o powerpoint o laptop travou exigindo a sua reinicialização. No processo de boot, porém, o palestrante se enrolou com a senha de acesso ao Word ("quem criou essa porra?") e ficou impossibilitado de expor as próximas 20 telas que ele ficou a madrugada toda montada com auxílio de seu primo designer. Humilhação. Algum burburinho na platéia contagiou a galera ouvinte e a platéia que antes tava muda soltou gargalhadas. O palestrante ficou tão constrangido, tão nervoso que teve uma convulsão e vomitou no palco. Amparado pelas moças de creme foi levado para fora. Terno de linho escuro todo fedendo a bile. No impulso incontrolável do vômito derrubou o laptop maçãzinha no chão. Não se sabe se por acidente ou vingança.
Palavras de ódio foram proferidas pelo alemão empresário. Ninguém entendeu. Foi o momento de maior introspecção.
A palavra foi devolvida ao mediador da mesa que não estava nervoso até avistar na platéia a pessoa que mais odiava neste mundo. Levantou-se na mesma hora e gritou para ele se pusesse para fora do recinto. Enquanto a segurança saia da imobilidade, ainda pudemos curtir a troca de xingamentos. Seu filhadaputa!!!
Nessas horas sempre tem um hipócrita que desliga o microfone. Grandes merdas. Como hapenning fica mais expressivo pois a pessoa profere seus xingamentos a capela sem o efeito estereofonico. É um show que põe a prova a eficiência acústica do local.
Um sucesso. Saímos da palestra. Foi servido um buffett. A platéia sem cerimônia comia tudo reclamando muito do evento é óbvio e também da comida.
Não tendo mais o que fazer, voltei pra minha casa, tomei banho, escovei o dente, liguei o comp e escrevi esse texto.

sexta-feira, novembro 19, 2004

O Incrível Homem-Fêmea

Pedro Prado e seu nome ridículo foram picados por uma mulher radioativa.
No quadrinho principal vc vê a mulher nua de peitos duros balançando violentamente (as linhas de movimento salientam esta situação). Ela emana um brilho amarelo. A classe de jovens olha atarantada na sala científica. Pedro Prado e seu nome idiota estão no caminho da mulher radioativa (dum balão de pensamento vc pode ler: "Céus! Aquela louca... Vem em minha direção!").
Na página seguinte vemos a mulher se atirar sobre Pedro e morder-lhe a testa. O quadro seguinte é uma verdadeira marca desse artista singular dos quadrinhos. O mundo roda numa espiral preta sobre fundo violeta, no cantp esquerdo está a cabeça gritante do jovem que parece girar. No centro da espiral (vejam só que maravilha) está uma boca carnuda de mulher. Ele pode não desenhar bem mas eu acho foda.

O jovem acorda no hospital cercado por seus familiares e amigos de faculdade. "Vc está bem?"
Esteve em estado de coma profunda por duas semanas e agora acorda como se nada tivesse acontecido. "O q houve?" - pergunta o pós-convalescente - " Me sinto ó-ti-mo." Esta ênfase no ótimo chama a atenção do grupo. Mas as transformações, como veremos nas páginas a seguir, foram beeem mais profundas que isso. Prossiga, caro leitor.

"Uma das cientistas do instituto de pesquisas enlouqueceu após ficar exposta acidentalmente a um raio brainiac. Felizmente, ela foi abatida por um guarda antes que picasse outros pobres inocentes."
"Vcs... a... mataram????" - Pedro diz com seus olhos cintilando...
"Mas... claro. Tratava-se de uma louca radioativa."
O quadrinho se abre para uma tomada geral... dramática... Pedro Prado chora copiosamente. Mas primeiro um choro contido, interno e sentido frgamentado em uma sequência sublime de closes em quatro retângulos estreitos, temrinando com o quadro grande onde o jovem desaba em prantos molhando a colcha da cama e abraçando sua mãe: "pq o mundo dos homens têm q ser tão covarde? não bastava simplesmente vcs tentarem desacordá-la?" Pedro emenda com um grito indignado e feroz: "Criminosos criminosos criminosos."
Todos ficam atarantados...
Pedro Prado ainda não sabe. Mas, naquele episódio nefasto, assumiu incríveis poderes que vão mudar sua vida e presentear o mundo com o mais improvável herói já criado pela indústria do entretenimento: o Homem-Fêmea.

Daí a poucos dias, ele passaria a viver incríveis aventuras defendo a humanidade contra a insensibilidade e a falta de objetividade dos homens. Mas também conheceria a paixão ao se defrontar com sua maior inimiga: a ardilosa She-Woman, a Mulher de Aço.
E é assim, amiguinhos, que vemos nosso Homem-Fêmea agarrado à Mulher de Aço e dando a ela uma pequena lição de feminilidade ereta mas... o q é aquilo na mão da vilã??? Putz... Por essa ele não esperava. Cuidado Homem-Fêmea.

Bom... É isso aí... Aguardem o próximo episódio do incrível Homem-Fêmea.

Caixa Preta em Tempo Real

Daqui t ouço.
Daí me vês.
Daqui pergunto.
Daí respondes.
Daqui t toco.
Daí me 'tambéns'.
Daqui me apresso e pego um trânsito. Dos diabos. Putz. Enfrento a barra de Copa ao meio-dia pra voltar pra fresta quadrada onde me arrasto e espero por t.
Daí c chega e pergunta o tempo que eu nunca sei se está bom.
Daqui me esquivo dos diretores e dos guardas da prisão. Eles rondam tossindo a noite inteira com problemas de pressão. Pressão. Fui flagrado olhando pela fresta, fudeu...
Daí me escreves. E trazes os saquinhos de chá pra tomarmos assim, ó... mó.
Daqui aguardo ansioso a próxima visita. É meu querido banho de sol no pátio.
Daí me trazes a lima dentro do bolo. Olhas prum lado e pro outro e t vai... d volta.
Daqui eu desgasto a grade. A boa e velha grade d todo dia. Eu tiro dela mais metal que sangue das minhas mãos. Quero esta puta bem fina. Escondo o pó dentro dos sacos de mó guardados no armário.
Daqui eu fujo.
E daqui eu chego aí.
E daí... a história é outra.
Bom, daí já não sei mais. Té amanhã. T. chau.

sexta-feira, novembro 12, 2004

Pequeno Histórico de Meus Problemas Mentais

Acho que eu tenho inveja, doutor.

Os diplomas todos palmilhando a parede indo juntos quase até o teto. Vai se fuder. Ninguém pode ter tanta formação assim. Os doutores se levantam. Os doutores andam. Os doutores apertam-se as mãos cirurgiãs.
Sou matéria. 10 graus abaixo na hierarquia do consultório. O orifício de entrada do bastão metálico no rêgo da bunda que senta na sala de espera é a base dum corpo no meio de ouvidos com asas voando ao som de Ray Connif e Kenny G. É por isso que meu nome é paciente. Pq eu espero.
Vamos ver quem é o paciente agora.
Encachaço essa porra pontiaguda em suas costas quando ele se levanta pra mostrar um relato de caso semelhante ao meu na página 55 de seu livro profilático preferido. O doutor de branco passa a vermelho_ vermelho que vai virando um continente_ continente de mapa que lembra muito a finada uniao soviética_ uniao soviética que agora se fudeu em coca-cola.
O doutor me pergunta porque o doutor me pergunta porque mas eu não sei dizer. Eu não sou médico e desconheço ainda o mal de que padeço.
Lhe puxo pela gola branca batomzada de sangue e sou eu quem pergunta: "Porquê?".

Máquina de Sexo Satânico

Acionada faz um ronco. O ronco cresce. É alto e preenche o quarto.
Comprei. Podem criticar. Podem dizer vcs seus pulhas que eu sou uma pessoa carente.
Do meu dinheiro cuido eu. Décimo-terceiro está aí pra isso.
Acionada, a louca me puxa e me agarra pelas costas.
Desgraçada.
A desgraçada é minha desgraça. Me puxa. Vejo essa cena mil vezes. Ela grava em um formato novo de video seus movimentos macabros e injeta as imagens em velocidade animal dentro do meu cerebelo. Tu te reteza quando ela entra em ti. A figura é ilustrada no manual. Page 6-1. É tudo imagem... Por enqunato. Depois ela acaba contigo.
A máquina. A verdade é que ela foi proibida. A tecnologia foi longe demais desta vez.
Atômica. Ela arrasa. Ela mata. Penetra. Gozas com ela. Gozas nela. Te puxa. Ela repete a cena quando sente que aquilo te excita. É filhadaputa. Repete e repete e daí faz outra coisa. A onda dela é a seguinte: te cercar de sexo aderente sangue-suga. Ela te chupa.
São seis braços que te puxam. E se parecem duros tentáculos metálicos, não são. São macios e quentes. Seis braços como os de Shiva. Então é por isso, descubro, este é o modelo Shivademon 600. Uma vagina para cada extremidade do seu corpo. Pênis em outros cantos. É para matar gregos e troianos.

(outra hora, continuo, chega... encheu...)

A Lista da Agenda Preta

Comprar um carro blindado.
Pintar as grades da casa.
Entrevistar o segurança.
Ligar para a operadora.
Xingar a telefonista.
Trocar de celular.
Beijar Maria na testa.
Beth. Beth. Beth.
Devolver a arma ao governo.
Pegar Beth no Centro.
Levá-la praquele lugar.
Comê-la imediatamente.
Comprar um gift pra Maria.
Deixar os kids com Maria.
Enchê-la de gadgets.

Beth. Beth. Beth.

quarta-feira, novembro 10, 2004

Peter Sellers Blues

Ga-iaaaa-to.
Assim ele era. Assim ele ééé. Inconspícuo (existe isso?). Não não não. Ra-ra-ra. Siniiiiiistro. Os de alma preguiçosa, ih, esses são os que se movem mais. Vaivendo.
Trapalhão. Sorrindo sem jeito. Amarelo e acanhado. E sempre, sempre, sempre... Atrasado.
Eis o que sempre é o último a chegar na festa. Lembra, mina, lembra? Chegou depois que terminou o show. Mas ele tenta, ele tenta... Ele tenta, viu?. Não há dúvida.
O rapaz até q é... es-for-ça-do. É mole?
Disfaaaarça... Ele fez de novo. Perto dela meteu os pés pelas mãos. Falou bobagem. Não ria ainda. Ele é assim mesmo... Um sujeito enrolaaado...
E ela?
Ga-iaaa-ta. Fez troça e disse um trocadilho que o deixou no ar. Máaaa. Ela é máaaa... Mó pilha. Mó. Mó. Mó. Ei, espera. Não vá ainda. Veja só o q foi q fez nosso herói depois.
Ela sorri dele, ele pisa e solavanca... bate com a testa na parede. Siiim. Acredite. Ele existe e está aí do teu lado.
Ela ri enquanto ele pega o ônibus errado. Divaaaga. Só descobre o mico quando já está do outro lado da cidade.
Q puxa. Um mix?... de Charlie Brown com Petter Sellers... Mister Bean de Jesus Cristo... Harold Lloyd com Cantinflas... Didi Mocó com vestes grunges, chinelão ou até descalço.
Descalço... quer mostrar sua firmeza e o amor à natureza mas, ai... no parque, arranca risos pisando em matinhos assassinos que espetam... Beeem malvados. Caraca. Viiixe. Aíii...
Cada plano seu é uma confa onde se enrola, enrola os outros, não dorme nem deixa os outros dormirem, acorda pessoas na madruga pra dizer q tah fudido e apaixonado.
Figuuura.
Ouve a música e pira. Na hora de beijar a guria, erra o alvo e acerta sua narina mas taria valendo se virasse um pouquinho mais pro lado. Chapado.
E ela???
Desconfia. Ela tem o dom do tempo. Sentiu a tentativa mas respeita o sinal e quer mostrar pra ele um caminho menos, bem menos, amargo.
Ele? Hmf... Não enxerga nada, se joga na cama, espalha bilhetes pela casa... foge pra rua. Sim. Pra dar um tempo dela ler qndo chegar... dele voltar e ouvir o veredicto... o tão temido re-sul-ta-do.
Ela?
Vai pro trabaaaalho. Estressada em pressa. Sem saber de nada. Mil problemas na cabeça. Veja só. Ele sai também. Muito depois. Vai para a rua. Vai para a praça. Pára por lá e se molha. Começa a chuva. É... Deus escreve sua comédia em linhas tortas e adivinhe quem é o azarado? É. Toooodo molhaaaado. De saco cheio. Volta pra casa em passo lento e pensativo. Rum-rum. Siiim. Preeeste atenção. Pq, demorado e melado... volta pro prédio. Se perde em chaves mas abre a porta enfim, escuta a porta assim (com a mão no ouvido como um cartum de Tex Avery - o rei o rei) e imagina histórias... sim. Entra na casa... iiih. Está furtivo. Assim como um cão ladrão q desconfia q vai levar uma coça do seu senhorio. Nada. Silêncio. Apê vazio. Ela ainda está no trabalho.
Ra-ra-ra
Se senta com
Cara de bobo bom
Não sabe se
ri ou se chora e
Na dúvida vai dormir
deixando as
cartas na mesa ih!
Não dorme.
Só pensa nas
Possibilidades
Dúvidas
Problemas
E
Ouve a chave
A porta. As cartas.
É ela. O peito dispara e ele diz: "pára" (foi mal o trocadilho).
Ele sai do quarto. Ela entra na sala. É simultâneo. Se encaram em susto.
Ela: "Tudo bem?"
Ele: "Tuuudo bem."
De novo.
Ela: "Tudo bem?"
Ele: "Tuuudo bem."
Ela se vira e tranca a porta. Ele estatela em pé, avista as cartas em cima da mesa. Mó mico. Mó ga-ia-to. Mó mó mó.
Ela (branca): "Tá tudo bem?"
Ele (pardo): "Tuuudo bem."
Ela se rende e vai tirar da secretária os seus recados.
Ele? Apanha as cartas. Num impulso troncho e covarde as esconde no bolso da calça qual um flagrante que se esconde do PM.
Ela? Olha pra ele e dá de ombros. Nem vê bilhete qualquer. Como se diz no Rio: "o flagrante foi malocado".
Ele? Olha pra ela e baixa os ombros. Fica calado.
Ah Peter Sellers.
Ah Oscarito.
És mesmo um sofrido sujeito engraçado.

Saem para comer. Ela falando. Ele calado. Ela encontra amigos e ele engole a língua. Bah. Ela animada. E ele? E ele nada. Perdeu playboy perdeu.
Mas amanhã, ele pensa: "eu tento de novo". Capaaaz.
Perdeu de novo. Ela veio e mostrou o jeito certo.
Ele? Cara de bobo.

Êita incorrigível sujeito engraçado.

terça-feira, novembro 09, 2004

Adeus ao Mundo Superior

Bem-vindo ao Mundo Superior - me diz a asa.
Azul em cima, branco em baixo.
Um gigantesco mundo de algodão. A asa recortada em luz por sombras roxas de si mesma. Brilhantissimo quadro de luz que ofende o olhar e deixa a íris turva.
Eu e mais 100 no avião.
As formações de nuvens se espraiando que nem um mar virando areia e virando montanhas enormes nem um pouco ameaçadoras. Convidativas até, pq não? Convidativas chamam pra habitar onde ali a população é zero. Se eu caisse... imaginei que meu corpo quicaria no fofo umas 7 ou 8 vezes até poder ficar de pé e andar. Eis o Mundo Superior que avisto lá embaixo.
Vai tomar no cu eu e todo o resto se esse mundo de agora não é o mesmo de milênios atrás.
Uma cultura baseada no lento. Deslizante... Caramujos albinos... E o azul.
A asa se oferece em sacrifício. Pq quer assim. Se parte e é lindo. Em câmera lenta para mim. Ela se parte e é assim: meus olhos marejam; rodopia e se eleva a barbatana de metal maravilha iluminada pelo sol, cintilando tudo, alternando brilhos. Rodopia e vai... Para o alto e logo para baixo... do avião se despede e segue em outra direção. As nuvens fofas nos aguardam tênues e pacientes. O sofá de deslizantes massas aguarda a entrada do pequeno abrigo metálico que desce. Dentro, nem me ouço e nem os ouço também.
Risos e preces. Bocas abertas. Borracha e fibra. A maravilha da tecnologia. A desesperança recompensada com a morte convergente. Eu e uma capa da Carta Capital. Eu e meu fone de ouvido. Eu e a máscara que desce. Eu e uma turbina pendente. Eu e o copo do suco de manga light caindo em meu colo. O etéreo som de um rock muito sujo e lento no ouvido. Descida. Se acelera o andamento em atraso com a realidade. O som que ouço será da música? Será de fora? A asa partida se despede. Longe longe, é engolida por nuvens. Só eu vi essa cena? Só eu?
O avião rodopia. É sua parte na dança.
Rodopia mas entao acha um prumo reto e vai. Me vejo de fora. Me vejo distante. Assistindo o silencioso encontro do avião com as nuvens do céu. Penetra. Não quica. Lá dentro, uma pintura de Pollock. Indiscernível mundo de sons e imagens. Gente e teconologia aeronáutica jogadas selvagemente sobre uma tela de pânico improviso.
Lá fora... As entranhas do Mundo Superior. Camadas e camadas de cinza. O rugido. A casa trrrreme. O mmmmunnndo trrrrrremmmmme. Tttttttudo trrreme nas entrrrranhas trrreme.
Estamos sob o mar ou sobre a rocha? Ouço eixos que se partem. Coisas que se partem. Não as vejo. Mas sei que se partem. Não as vejo pois só tem um imenso quadro de Pollock à minha frente.
Existem crianças aqui dentro. Algumas não choram mais.
Existem velhos espalhados pelo chão. Já existem corpos que brincam de pular do chão para o teto, do teto para o chão. Me sinto alheio. Me sinto assim, ó, com a loucura. Me enterneço com marido e esposa mortos abraçados esmagados entre poltronas suicidas.
Meu assento é um lar. É um ninho.
Vuchhhhhhhhhhhh. Me enterneço. O rugido é ainda mais alto e trovejoso, tudo em crescimento, o mundo corre, minha cabeça atirada pra trás, quebra-me ao estalar meu pescoço quebra-me ao tudo não morro e não me deixo morrer sem antes ver minha ultima visão que é um som com forma
matéria pura matéria pura
explode água lá na frente em gélido gozo oceânico
invasão de mar_ de bolhas_ de tripulação
mecanismos
a água encontra seu lugar
bóiam corpos alguns gordos alguns magros
corpos de ternos
manchados de sangues deles e de outros
poltronas antes tão firmes se tornam brinquedos de partir
cenografia exclusiva de filme de monstro japonês
minha vista fica turva novamente
escurece em água
se acoberta em frio


Bem-vindo ao Mundo Inferior.


sábado, novembro 06, 2004

Assim...

Sentado sobre o caos.
Sentado a frente do caos.
Mas nunca sentado acima do caos.

"não se resolve um problema com outro não se resolve um problema com outro não se resolve um problema com outro não se resolve um problema com outro não se resolve um problema com outro"

Repitia apático sentado
à beira do caos sobre o caos
nunca acima

então resolveu ir para dentro

agora, sentado dentro
nunca fora
dorme, ama e trabalha
nesse lugar aprazível.

quarta-feira, novembro 03, 2004

A Matilha

Um grupo que se autodenomina 'A Matilha' não pode ser composto de pessoas agradáveis.
Não é mesmo?

De fato, Peterson sabia onde estava mexendo. Um vespeiro que ao menor movimento acionaria a mais absurdamente cruel máquina de assassinos. A Matilha é uma escola. A Matilha é um sepulcro. A Matilha é onde o que nasce bom se torna horrendo e o que nasce mal tem medo de si mesmo.

Muitos estudiosos, acreditando ser uma lenda, tentaram descobrir o tanto de realidade e o tanto de carochinha por trás da biografia do grupo. Muitos estudiosos atestaram a veracidade do horror com suas mortes. Mas Peterson não era um estudioso. Era só um cidadão. Na verdade, nunca se interessara por romances policiais nem por noticiários de crimes. Ele só queria uma coisa muito simples... Saber do seu filho.

Muitos pais abandonam seus filhos quando eles se tornam parte da Matilha. Os técnicos da polícia - os agentes - recomendam que se dê como morto. Uma vez no grupo não resta nada do que foi o elemento. O elemento é só parte. É só um assassino. A alma abandonada resseca e some. Assume seu lugar um novo ser, nada parecido com o que se foi mas uma cópia idêntica dos fiéis membros da Matilha. Por isso, recomenda-se aos pais, esquecer...

Peterson não esquecia. Nem tentou. Na entrevista com os agentes mentiu. Sim, ele até queimou todos os retratos do filho (os vestígios de sua existência anterior). Sim, ele também destruiu brinquedos: o velocípede azul, a girafa de plástico, o caderninho do colégio. Recomenda-se isso pois fica mais fácil eliminar laços afetivos a partir da desintegração da memória visual. As despesas saem por conta do Governo. Está na cartilha.

Peterson e Mary queimaram tudo. Em cumprimento à lei, nomearam testemunhas que assistiram caladas ao ritual do esquecimento. Nenhum choro. Peterson não chorava. A temida escola de assassinos raptara seu filho mais novo e mais puro... e ele não se permitiu uma lágrima.

Peterson. 45 anos. Técnico em eletrônica. Pai.

Um nome no jornal pode dizer muito a uma mente que procura. O agiota recebeu Peterson com um sorriso que murchou rápido diante da frieza do homem. Não havia muito o que dizer mesmo. Agiotas têm no sangue um veneno. Pouco importa a vida. Pouco importa a família, a moral e até mesmo o medo da punição. Esse veneno é sua ruína e seu vício. Esse vício é dinheiro. Notas frias, novas como ele exigiu, depositadas em cima da mesa substituíram a frieza de Peterson Pai. A lingua da grana é o esperanto dos agiotas. Apanhou-as e pagou com um papel. Papel escrito e repleto de nomes. Cada nome um numero. Um telefone. O começo da busca.


A Receita do Sucesso do Dr. Inverso

Para não me tomarem por bobo, fui babaca.
Para não causar confusão criei uma quizumba.
Para não ser mal, fui escroto.
Pra não machucar, machuquei.
Para não dar merda, caguei.
Fiz tudo errado para fazer o certo.
Me enrolei e desenrolei e não satisfeito piorei a coisa. Fiz, desfiz, refiz. Morri pra nascer e matei pra deixar viver. Uma confusão dos diabos. Um nó górdio. Nunca se viu igual. Faça uma tese.
Em cima do laço. Na prorrogação do segundo tempo. Chutando a bola no improviso planejado. Inaugurei o instinto racional e a confusão construtiva. Fui parar onde eu queria fazendo o que não queria. Magoei quem eu não queria. Recorri a auto-ajuda só pra seguir tudo ao contrário. Pensei pacas, usando a desrazão.

O mais foda é que deu certo.

Calma. Depois te conto essa história.