segunda-feira, abril 18, 2005

Heróis

Se olhasse para trás teria visto sua vida.
Se olhasse para trás mas não olhou. Orgulhoso, preferiu seguir em frente se achando muito certo de seus atos. Covarde, atinou que nunca chorou antes como naquela noite. O lado oculto lhe disse coisas após anos e anos de silêncio. Era agora a hora e a vez das sombras dominarem seu ser.
10h 30 e estava atrasado. Olhou o relógio traidor. A engrenagem imbecil havia falhado outra vez. Mais uma chance perdida e um dia de sol e vazio a sua espera. Grande coisa... Absoluto, mordeu uma banana e tentou fazer o velho jogo de dizer bom-dia para si mesmo. Não conteve uma risada e uma risada seguida dum espasminho porque definitivamente estava engraçado. Escorria pelo espelho algo que lhe saltara da boca.
Os eventos da madrugada vinham em flashes. Sonhos despertos que teve sentado na cama como um guru. Fora uma noite insone e muito bela com direito a mesma lua em diferentes momentos, o coral de dez gatos e o ronco da sra. Edgar. É, dez mil anos se passaram para a civilização gerar uma mulher Edgar. Dez mil anos... entre os quais gerou-se também o espelho, o café da manhã e o poder da vontade conforme Schopenhauer. Bem antes disso, o hominídeo comeu sua primeira banana e entendeu no outro o espelho torto de si mesmo. Nada mais.
Lá fora, passavam flechas automotivas e icebergs com pernas. Não procure entender essa visão. Isso não é uma alegoria. Nosso herói solitário prosseguia, galgando seu dia na forma de escalar a Rua Street até chegar a algum escritório. Havia uma chave em seu bolso. Sua missão: deveria engendrar uma cópia e eu nunca vi tamanha profusão de verbos mal empregados como neste texto. O chaveiro estava fechado.
Na casa do chaveiro, o despertador também não tocara e o pobre gordo monstro desabava em suor para fora da cama e se ajeitava no espelho na permissão do espaço que tinha. Sofria do mal de chagas e, ainda não sabia, mais outra doença pior. A fome do gordo não existia. Ele não estava comendo uma banana mas mastigava a pasta de dentes. Uma sensação quase incômoda de cerdas arranhando dentes que trituram cerdas e algo que já fora macerado pela máquina.
Na casa de Edgar, havia ela e mais 3 crianças. Quatro dos dez gatos da noite eram dela e estavam miando. A três crianças nâo miavam e não eram suas. Oito seres naquele lar. Não havia carinho para todos.
Nosso herói, diante da frustrada viagem ao chaveiro, resolveu prosseguir em busca de outro escritório. O chaveiro exercitou-se abotoando o jaleco azul e por um instante se perguntou quem era aquele espelho diante de si. A chave bordada no jaleco apenas sorria pois não tinha respostas. Edgar se perguntava porque não mudou de nome quando era mais moça.

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